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quinta-feira, 3 de janeiro de 2013


MATÉRIA DO JORNAL PRIMEIRA IMPRESSÃO POR JULIANA KUCHARUK

Medicina sem vestibular continua atraindo brasileiros na ARGENTINA
Adaptações ao idioma, cultura e a distância da família são as principais barreiras para quem decide
seguir o sonho no exterior
Juliana Kucharuk

Com os altos custos das universidades particulares na área médica e com a concorrência acirrada por uma vaga nas universidades públicas brasileiras, pessoas de todas as idades têm buscado em universidades no exterior o tão desejado diploma de Medicina. Um dos países mais procurados por brasileiros é a Argentina
e a tão cotada Universidade de Buenos Aires (UBA).
O que tem atraído a atenção dos brasileiros é a facilidade para ingressar no ensino superior, que não trabalha com o sistema de vestibular. Os interessados escolhem o curso desejado, fazem uma inscrição e começam a estudar no Ciclo Básico Común (CBC), denominado pela UBA, semelhante ao cursinho no Brasil. Quando os estudantes conseguem aprovação em todas as matérias do CBC estão aptos para prosseguir com o curso.
No caso da Medicina, este curso conta como o primeiro ano da faculdade. Em média, o curso tem um ano de duração podendo ser feito em menos ou mais tempo, ficando a critério do desempenho do aluno. Se o aluno demorar mais de três anos para concluir todas as matérias do CBC, ele deve recomeçar o curso. Depois desse investimento de tempo, o estudante ainda tem mais seis anos pela frente até colocar a mão no diploma.
Esse foi um dos fatores que influenciou o baiano Shigemi Yamauchi, de 41 anos, a mudar-se, em 2011, para Buenos Aires com esposa e dois filhos. Depois de diversas tentativas de ingressar em uma universidade pública brasileira, Yamauchi ouviu falar sobre o êxodo de brasileiros para os países da America Latina. Em busca do sonho de ser clínico, ele e sua família decidiram embarcar para a Argentina. “A causa principal foi não conseguir passar no vestibular de uma faculdade pública, já que as mensalidades das privadas eram inviáveis. E como sabemos não basta termos boas notas, temos que estar na cabeceira. Depois de tomar a
decisão de sair do país, listamos a educação, segurança, estabilidade e custo. Fizemos uma pesquisa em sites, reportagens, mas o que mais contribuiu foram as informações dos amigos que já haviam vindo passear. A educação básica é boa, me sinto seguro, o país demonstra estabilidade, o custo de vida não foi o mais barato mas cabia no orçamento. E além do mais, das universidades regionais a UBA é uma das mais conceituadas internacionalmente, o que pesou muito na decisão de vir”, afirmou. Para Yamauchi, que concluiu o CBC para Medicina no primeiro semestre deste ano, o sistema de ingresso das universidades na Argentina em comparação com os vestibulares do Brasil é mais justo e inclusivo.
O caso do brasiliense Tiago Magalhães, de 27 anos, não foi diferente. Depois de prestar vestibular, tanto para faculdades públicas quanto para particulares, sem conseguir ingressar, optou por deixar o emprego e a família e seguir na direção do sonho de ser cirurgião. “Eu trabalhava e não podia me preparar como deveria. Já havia tentado entrar varias vezes e vi que não chegaria ao nível ideal para passar no vestibular. O que me chamou a atenção na Argentina foi que não havia vestibular e que o método de ingresso era o CBC. Então, como eu acho que o vestibular não mede a inteligência de ninguém,vi que teria uma grande oportunidade de fazer medicina na Argentina”, argumentou. Para Magalhães, o lado bom do sistema argentino é o fato de ampliar o acesso do aluno à Universidade, mesmo que o grau de dificuldade para se formar seja maior. “O aluno desde o início já faz algo de acordo com a sua carreira. Este sistema não exclui ninguém por falta de vaga e sim por falta de capacidade do aluno”, disse. Adaptação Um dos percalços que os brasileiros podem enfrentar quando decidem morar no exterior é a adaptação à cultura e ao idioma. “No começo foi complicado porque eu não entendia muita coisa por causa da língua. O que ajudou muito foi conhecer pessoas que estavam no mesmo barco que eu, brasileiros que também vieram sozinhos para estudar, e um ajudava o outro mesmo sem conhecer realmente”, ressaltou Magalhães. Os fatores psicológicos também contam na hora da decisão, caso contrário o estudante pode ficar tentado a desistir antes de concluir o curso. “Sentia bastante saudade da família, mas como estava aqui para realizar um sonho e sabia que a minha família estava torcendo por mim e que foi Deus que abriu as portas para que eu viesse para este país, permaneci focado no meu objetivo”, explicou.
As primas Bárbara, de 19 anos, e Bruna Muller, de 20 anos, que estão estudando na Universidad Maimónides, também passaram por estas mesmas dificuldades quando saíram do Mato Grosso para Buenos Aires, em 2011. Elas estavam no último ano do curso de Biomedicina quando optaram por seguir o sonho de um dia poder ajudar a cuidar da saúde do ser humano. “Foi uma mudança brusca quando saí de casa para vir para a Argentina. Primeiro pelo fato de eu ser extremamente apegada a minha família e outro motivo relevante foi pelo espanhol porque nunca havia feito curso. O que amenizou foi vir com minha prima e em relação à língua o que mais me ajudou foi fazer amizade com argentinos, mas nunca sofri por esta escolha”, contou Bruna. Para Bárbara, apesar dos desafios a experiência foi considerada tranqüila e hoje já se adaptou aos costumes do país. “Sai de casa aos 18 anos, mas como sou uma pessoa centrada, tentei pensar no que eu queria e passar em cima de qualquer barreira. Acho que o fato de estar em outro país se torna atrativo, desde que a cidade escolhida seja boa, como é Buenos Aires. Isso é muito motivador”, disse.
Yamauchi também acredita que fazer o que sempre desejou faz com que a pessoa passe por cima das principais barreiras. “Para mim, o período de adaptação foi rápido e sem nenhum percalço. Meus filhos também se adaptaram rápido e aprenderam o idioma com facilidade, mas ainda hoje reclamam dos dois turnos que passam na escola (oito horas) além das seis horas de aula de música semanais oferecida pela escola, que é bilíngue e pública. Pensei até que seria mais difícil, mas quando estamos determinados e apaixonados, os obstáculos são detalhes irrelevantes”.
Revalidação Apesar das vantagens para aqueles que pretendem retornar ao Brasil para exercer a profissão,    nem tudo são flores. Desde 2010, os ministérios da Educação e da Saúde organizaram um sistema nacional,
para viabilizar a revalidação do diploma de Medicina no Brasil, que consiste na realização de um exame nacional composto por uma prova teórica e de avaliação de habilidades clínicas. Os interessados em revalidar o diploma devem seguir o protocolo, sendo que ele só passará a ter validade no Brasil se for revalidado por universidade brasileira pública que tenha curso igual ou similar, reconhecido pelo governo. O processo consiste em entrar com requerimento, pagar taxa estipulada pelo MEC, realizar as provas avaliadas por uma comissão e ser aprovado. Desde 2011 o tema vem sendo discutido pelo governo brasileiro. Em abril deste ano a presidente Dilma Rousseff encomendou um plano que procura ampliar a oferta de profissionais de saúde. O plano é trabalhar em duas frentes: ampliar os cursos de Medicina e, enquanto a nova leva de profissionais não se forma, incentivar o ingresso de profissionais que cursaram faculdades estrangeiras.
Em abril, a Casa Civil solicitou um levantamento das alternativas para facilitar o visto de trabalho de médicos
formados no exterior e os ministérios da Saúde e da Educação trabalham para criar opções para o exame de validação do diploma. Uma das ideias é a criação de uma espécie de estágio para graduados. Remunerado pelo governo, o curso teria duração de até dois anos. Nesse período, o profissional trabalharia na rede pública, principalmente no Programa de Saúde da Família. Parte da equipe defende que, ao fim da preparação, o profissional teria o direito de seguir trabalhando no País, sem fazer a prova para validar o diploma. 

Edição e diagramação: Mariana Serra
PRIMEIRA IMPRESSÃO - Setembro de 2012

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